Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura
e
fascinante tarefa de viver"
(Em "A
Pedra do Reino")
"Perdemos um grande poeta. Perdemos um grande romancista. E
perdemos, acima de tudo, um grande professor de ternura e da simplicidade
humana"(Ricardo Barberena, professor da PUC-RS)
- Morreu Suassuna? E como foi isso?
Pois é, Chicó, foi trágico seu
falecimento; contudo, nós do "Café com LetraZ" sabemos informar como
foi. Ariano morreu no dia 23.07 deste ano no Real Hospital Português no Recife,
vítima de uma acidente vascular cerebral (AVC), caiu em coma e passou a
respirar com a ajuda de aparelhos. Após sua morte, foi sepultado no Cemitério
Morada da Paz em Paulista (Recife).
A origem de "Suassuna"?
A respeito da origem de seu nome
temos uma explicação patriótica: depois
da independência do Brasil (7 de setembro de 1822) e aproveitando o tema da
nova pátria juvenil houve uma moda nacionalista no Brasil de adotar nomes
indígenas. Assim, o bisavô de Ariano escolheu
o nome "Suassuna" (cuja origem vem do Tupi), vocábulo que
também designava o nome de um riacho local.
Teve uma formação o que se
poderia dizer de "eclética", cursou o “Ginasial” no renomado Colégio
Americano Batista e o “Colegial” (Ensino Médio) no Ginásio Pernambucano. Formou-se
em Direito e posteriormente em Filosofia. Mas ainda na faculdade, não conteve sua veia artística o que acabou
resultando na fundação do “Teatro do
Estudante” em Pernambuco.
Assim, era calvinista de
formação (de igual modo também o era o
recentemente falecido presbiteriano Rubem Alves); posteriormente, se tornou
agnóstico até converter-se ao catolicismo
cujos princípios marcariam sua obra - basta lembrar-nos da temática
central do "Auto da Compadecida".
Suassuna:
poeta, dramaturgo e romancista
Como veremos cultivou os três
gêneros literários a despeito de se declarar um "escritor de poucos livros
e poucos leitores". De 1958 a 1979 dedicou-se somente à prosa; de forma
geral, entre suas obras mais destacadas temos:
- "Uma
mulher vestida de sol" (1947) -primeira obra teatral que lhe rendeu o "Prêmio Nicolau Carlos
Magno"; "Cantam as harpas de Sião ou o Deserto de Princesa",
(1948); "Auto de João da Cruz" (1950); "O Auto da
Compadecida" (1955) que o projetou
em todo o país além de ter sido adaptada para a televisão e
posteriormente formatada para o cinema; "A pena e a Lei" (1955) - premiado no Festival Latino-americano
de Teatro; "O Santo e a Porca - O Casamento suspeitoso" (1958);
; "A Pedra do Reino" (1958); "O Homem da vaca e o
poder da fortuna" (1959);
"A farsa da boa preguiça"
(1960), "A Caseira e a Catarina" (1961); "O
príncipe do Sangue Vai-e-volta" (1971); "História dÓ Rei
Degolado nas Caatingas do Sertão / Ao Sol da Onça Caetana" (1976) -
romance armonial popular brasileiro.
"Não troco meu 'oxente' pelo 'Ok' de ninguém" - com essa
frase, Ariano expunha seu exacerbado espírito nacionalista, além disso era
conhecido por defender nossa cultura e nossos valores nativos de "invasões
estrangeiras", culturalmente falando. Também ficou famoso por se revelar
um privilegiado professor, rodando todo o país com suas aulas-espetáculo (misto
de palestra, concerto e espetáculo de dança); dissecava assim, com graça de
palhaço, a cultura brasileira, suas origens ibéricas, a tradição dos violeiros,
dos cantadores, dos cordéis, das rabecas, exibindo toda a sua erudição e fervor
por nossas raízes...
Cativava as multidões quando
pintava um reino "onde pingos prateados brilhavam ao sol". Já nos
idos anos 70, fundou o Movimento Armorial e toda a sua obra gira em torno desse
ideal. Por tudo isso, o escritor apresentava-se como um defensor
ufanista da cultura popular brasileira contra a colonização cultural
norte-americana. Era opositor do "maracatu
eletrônico" e se recusava, por exemplo a chamar Chico Science (vocalista
da Nação Zumbi) pelo nome artístico,
assim o chamava de "Chico Ciência" - o que lhe rendeu o rótulo
de xenófobo.
·
Suas obras foram traduzidas
para o inglês, francês, espanhol, alemão, holandês, italiano e polonês
projetando-o no panorama internacional.
·
Também foi membro da Academia Paraibana e
Pernambucana de Letras além de ser nomeado para a cadeira nº 35 da Academia
Brasileira de Letras em 2002.
·
Foi galardoado com o título de
"Doutor Honoris Causa" por várias universidades nordestinas
como a Universidade do RN, Universidad de PE, Passo Fundo e pela Universidade
Federal do CE.
·
Foi veemente homenageado de norte
a sul do país, no ano de 2007, em ocasião de seus 80 anos, pela grandiosidade
de seu trabalho. Como odiava avião, porém tinha de valer-se dele para poder
atender a todos os compromissos e homenagens a ele prestadas brincava: "Se
eu soubesse que chegar aos 80 anos daria
tanto trabalho, teria ficado nos 79".
·
De família de veias também políticas,
assumiu em 2007 a Secretaria de Cultura de Pernambuco a convite do então governador (e recentemente falecido
candidato à presidência) Eduardo Campos. Igualmente falando de morte, o
assassinado de seu pai e também político, João Suassuna, ocupou uma posição de
destaque propulsando ainda mais sua inquietação criadora.
Uma das paixões de Suassuna era a
obra do basco Miguel de Unamuno. O
escritor espanhol afirmava que os homens vivem juntos, porém cada um morre
sozinho: "A morte é a suprema solidão". Contudo, a morte de Suassuna
não foi solitária, mesmo porque no mesmo mês
perdemos também dois igualmente grandes ícones do cenário literário
nacional: Rubem Alves (tema do "Café com LetraZ" do mês de agosto) e
a João Ubaldo Ribeiro (ocupante da cadeira 34 da ABL - Academia Brasileira de
Letras). "Você não morreu sozinho não, morremos todos nós" - resposta
do bispo à Lampião - O Auto da Compadecida)
De Suassuna, o que nos resta agora, além de seus livros
são: sua ideologia humanista de raízes
católico-calvinistas - a "pedagogia da partilha dos sonhos humanos" e
a rememorável lembrança de seu sorriso... Certamente, neste exato instante estará
nas regiões etéreas e (se é que foi
absolvido no "juízo celestial" como ele mesmo imaginava), estará junto
a seus companheiros de trabalho que lhe influenciaram sobremaneira, como foram:
Cervantes, Planto, Unamuno, João Grilo Chicó, Eurico e todos os outros
personagens da literatura de Cordel. Lá do alto, nos acenará e, cá nos despedimos dele em grande estilo com seu poema debutante no mundo
das artes e das letras.
Noturno[1]
Têm para mim Chamados de outro mundo
as Noites perigosas e queimadas,
quando a Lua aparece mais vermelha
São turvos sonhos, Mágoas proibidas,
são Ouropéis antigos e fantasmas
que, nesse Mundo vivo e mais ardente
consumam tudo o que desejo Aqui.
Será que mais Alguém vê e escuta?
Sinto o roçar das asas Amarelas
e escuto essas Canções encantatórias
que tento, em vão, de mim desapossar.
Diluídos na velha Luz da lua,
a Quem dirigem seus terríveis cantos?
Pressinto um murmuroso esvoejar:
passaram-me por cima da cabeça
e, como um Halo escuso, te envolveram.
Eis-te no fogo, como um Fruto ardente,
a ventania me agitando em torno
esse cheiro que sai de teus cabelos.
Que vale a natureza sem teus Olhos,
ó Aquela por quem meu Sangue pulsa?
Da terra sai um cheiro bom de vida
e nossos pés a Ela estão ligados.
Deixa que teu cabelo, solto ao vento,
abrase fundamente as minhas mãos...
Mas, não: a luz Escura inda te envolve,
o vento encrespa as Águas dos dois rios
e continua a ronda, o Som do fogo.
Ó meu amor, por que te ligo à Morte?
Têm para mim Chamados de outro mundo
as Noites perigosas e queimadas,
quando a Lua aparece mais vermelha
São turvos sonhos, Mágoas proibidas,
são Ouropéis antigos e fantasmas
que, nesse Mundo vivo e mais ardente
consumam tudo o que desejo Aqui.
Será que mais Alguém vê e escuta?
Sinto o roçar das asas Amarelas
e escuto essas Canções encantatórias
que tento, em vão, de mim desapossar.
Diluídos na velha Luz da lua,
a Quem dirigem seus terríveis cantos?
Pressinto um murmuroso esvoejar:
passaram-me por cima da cabeça
e, como um Halo escuso, te envolveram.
Eis-te no fogo, como um Fruto ardente,
a ventania me agitando em torno
esse cheiro que sai de teus cabelos.
Que vale a natureza sem teus Olhos,
ó Aquela por quem meu Sangue pulsa?
Da terra sai um cheiro bom de vida
e nossos pés a Ela estão ligados.
Deixa que teu cabelo, solto ao vento,
abrase fundamente as minhas mãos...
Mas, não: a luz Escura inda te envolve,
o vento encrespa as Águas dos dois rios
e continua a ronda, o Som do fogo.
Ó meu amor, por que te ligo à Morte?
Frases célebres de Suassuna
" Vivo extraviado em meu tempo por
acreditar em valores que a maioria julga ultrapassados. Entre esses, o amor, a
honra e a beleza que ilumina caminhos da retidão, da superioridade moral, da elevação, da
delicadeza, e não da vulgaridade dos sentimentos"
"A massificação procura baixar a
qualidade artística para a altura do gosto médio. Em arte, o gosto médio é mais
prejudicial do que o mau gosto... Nunca vi um gênio com gosto médio"
"...que é muito difícil você vencer a
injustiça secular, que dilacera o Brasil em dois países distintos: o país dos
privilegiados e o país dos despossuídos"
"Jesus às vezes se disfarça de mendigo
para testar a bondade dos homens"
(O Auto da Compadecida)
"É tanta qualidade que exigem para dar
emprego que não conheço um patrão com condição de ser empregado" (João
Grilo - "O Auto da Compadecida")
"Matar padre dá um azar danado
principalmente para o padre" (O Auto da Compadecida)
"A gente tem uma tendência a acreditar
que não morre"
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